Ao pensar em quem precisa de flexibilidade no trabalho para conciliar a vida profissional com a pessoal, quem vem à sua cabeça? Se você é como a maioria das pessoas, pensou nas mães trabalhadoras.
A suposição predominante é que as mães que trabalham são aquelas que querem e precisam de flexibilidade no trabalho. Com certeza, muitas mães trabalhadoras ainda dão conta da árdua dupla jornada de trabalhar em tempo integral e atender às responsabilidades básicas dos filhos, e muitas, provavelmente, querem empregos que lhes deem mais flexibilidade para lidar com essas responsabilidades importantes. Quase duas décadas de pesquisa mostram que, para muitas mães trabalhadoras, trabalhar de forma flexível é semelhante a trabalhar em desvantagem: aquelas que o fazem costumam ser “mamães monitoradas” em cargos menos demandantes e com salários mais baixos, e nos piores cenários, são completamente afastadas do trabalho.
Mas suspeitamos que a flexibilidade não seja apenas um “problema da mulher”. Todos precisam de flexibilidade em algum momento da carreira, seja para levar o animal de estimação ao veterinário, para ser padrinho de casamento do irmão ou para prestar as últimas homenagens no velório da tia-avó. Portanto, as mães trabalhadoras podem não ser as únicas a sofrer profissional e pessoalmente ao se sentirem incapazes de conciliar o trabalho com coisas do cotidiano. Por isso, fizemos uma pergunta que raramente é abordada em estudos acadêmicos: o que acontece quando os funcionários em geral, e não só as mães, acham que trabalhar de forma flexível possa prejudicar suas carreiras?
Em dois estudos, recentemente publicados nas revistas Sociological Perspectives e Community, Work & Family, examinamos como o viés de flexibilidade no trabalho – a crença dos funcionários de que as pessoas em seu local de trabalho provavelmente são prejudicadas se tiram alguma licença ou trabalham de forma flexível – afeta o envolvimento das pessoas no trabalho, suas intenções de permanecer ou deixar o emprego, sua capacidade de equilibrar a vida profissional e pessoal e até mesmo sua saúde.
Nossos dados vêm de uma amostra significativa coletada pelo Families & Work Institute com cerca de 2.700 funcionários dos EUA. Na pesquisa, perguntaram aos funcionários se eles acreditavam que seus colegas de trabalho poderiam ser prejudicados caso tirassem folga ou remanejassem seus horários por motivos pessoais. Nossa análise inclui funcionários de uma série de cargos, indústrias e setores e de diferentes origens raciais, étnicas e socioeconômicas. Dessa forma, fomos capazes de contabilizar uma variedade de fatores que podem afetar as atitudes dos trabalhadores com relação ao emprego, aos efeitos colaterais causados pelo trabalho e à sua saúde.
Mostramos que, quando a flexibilidade é mal vista nas empresas, os funcionários são mais infelizes profissionalmente e têm mais chances de abandonar o emprego no futuro próximo. É importante ressaltar que os efeitos desse preconceito não se limitam apenas às mães, pois afetam até mesmo os homens que não têm filhos e que nunca tiraram licença familiar ou trabalharam em horários flexíveis.
Também descobrimos que a discriminação contra as pessoas que trabalham em horários flexíveis não as afeta apenas no trabalho, mas também em casa. Ela aumenta o número de efeitos colaterais causados pelo trabalho, de pequenos problemas de saúde e sintomas depressivos, além de levar a mais absenteísmo e piorar a qualidade do sono. Esses efeitos surgem em pais e mães que trabalham, homens e mulheres sem filhos e pessoas de todas as faixas etárias e grupos raciais e étnicos.
Por que o preconceito contra flexibilidade no trabalho é tão prejudicial a todos os tipos de funcionários? Acreditamos que os funcionários geralmente não gostam de trabalhar em empresas que os possam penalizar por terem uma vida fora do trabalho. Eles não se sentem apoiados e notam uma falta de controle sobre seus horários. Também cremos que essa discriminação limita o grau com que os funcionários conseguem cumprir com suas responsabilidades pessoais e familiares, e também é prejudicial à saúde (por exemplo, quando alguém adia a ida ao médico por ter medo de se afastar do trabalho).
Não estamos sugerindo que os funcionários não tenham a responsabilidade de comparecer regularmente e de ser engajados. O absenteísmo e o desengajamento são, sem dúvida, problemas multibilionários nos EUA. No entanto, quando as empresas ignoram a vida pessoal e familiar dos funcionários – e mantêm culturas trabalhistas que os deixam com medo de pedir ou usar a licença e a flexibilidade de que precisam – elas estão exacerbando os problemas, e não resolvendo-os.
Nossa pesquisa também mostra que ter uma força de trabalho engajada, comprometida e saudável não depende apenas de oferecer um pacote generoso de licença familiar e opções de trabalho flexíveis. As empresas também precisam prestar muita atenção à mensagem que passam aos funcionários sobre o uso efetivo dessas políticas, que podem significar pouco quando os funcionários acham que sua carreira será prejudicada.
Para entender se esse sentimento é predominante na sua empresa, comece a prestar atenção na frequência com que suas opções de flexibilidade estão sendo usadas e por quem. Pesquisas anteriores revelam que, muitas vezes, os trabalhadores evitam tirar licença ou trabalhar em horários flexíveis, mesmo quando precisam, por medo do que pode acontecer com sua carreira. Se os funcionários, ou alguns subgrupos de funcionários, não estiverem aproveitando as opções de flexibilidade quando precisam, isso é um sinal de alerta.
Se os funcionários da sua empresa têm medo de tirar licença ou de trabalhar em horários flexíveis, há algumas coisas que se pode fazer como incentivar gestores a dar o exemplo. Quando os gestores tiram licença paternidade e maternidade integral, voltam para casa mais cedo alguns dias da semana para ajudar os filhos a descer do ônibus escolar ou chegam atrasados depois de uma consulta odontológica, seus colegas de trabalho sentem-se mais à vontade para sair de licença ou trabalhar com flexibilidade de horário. As empresas que tomarem essas medidas provavelmente terão funcionários mais saudáveis, mais produtivos e mais comprometidos.
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Lindsey Trimble O’Connor é professora assistente de sociologia na California State University. Estuda as forças sociais psicológicas, organizacionais e culturais que perpetuam as desigualdades no local de trabalho contra mulheres e trabalhadores com responsabilidades que exigem cuidados.
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Erin Cech é professora assistente na University of Michigan. Estuda processos de reprodução de desigualdade culturais, especialmente pelos mecanismos do “princípio da paixão”, da ideologia meritocrática e das definições populares de trabalho bem-feito e bons trabalhadores.
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Tradução: Luiza Monteiro Queiroz
Fonte: HBR