Às vezes imagino qual seria minha reação se, como um jovem de 20 e poucos anos estreando na Price Waterhouse há quase 30 anos, eu tivesse sido magicamente transportado para a PwC atual.
Eu estaria impressionado por ver como ela mudou. Durante a maior parte de minha carreira na empresa, o sistema de recompensa focava mais na quantidade que na qualidade do trabalho, embora clientes, na época, exigissem padrões tão altos como os atuais. Maiores bônus e promoções eram oferecidos a quem sacrificava mais sua vida pessoal, enquanto nossa política atual de RH recompensa principalmente a qualidade e valoriza o trabalho e as necessidades pessoais de cada um.
Entre meus colegas, os que fazem parte da geração do milênio (ou millennials) enfatizam que encontram satisfação em seu trabalho e sentem à vontade para expressar o que esperam da carreira e da organização. Eles também são extremamente direcionados para a globalização — sabem e se preocupam muito mais sobre o que está acontecendo no mundo atualmente que eu na idade deles. E são peritos em utilizar avanços tecnológicos para serem mais flexíveis.
Mas, acima de tudo, eu me surpreenderia com o fato de que os millennials da PwC não só não fazem questão de conhecer os objetivos da organização — sua razão de existir —, mas também estão preparados para sair da empresa se esses objetivos não se alinharem com seus próprios valores.
Quando eu estava começando, nós sabíamos o que estávamos fazendo, mas não perguntávamos por que fazíamos. Não dávamos muita importância para nosso papel — ou da empresa — na sociedade. Para mim, esse ponto cristaliza o conflito de gerações que a PwC e muitas outras organizações estão enfrentando à medida que mais millennials são contratados.
Felizmente, minha aprendizagem nessa faixa etária não aconteceu instantaneamente. Foi um processo gradual que incluiu passar um período no departamento de RH, observando e conversando com millennials e participando da criação de meus filhos, que são da mesma geração. Mas eu não me dei conta de como eu realmente sabia pouco sobre a contribuição desses jovens funcionários até a PwC colaborar com pesquisadores da University of Southern California e da London Business School em 2011-2012, num estudo sobre millennials e seus níveis de comprometimento. Embora os jovens do milênio tenham muito em comum com seus colegas mais velhos, o estudo quantificou algumas diferenças bem reais entre gerações — diferenças que são importantes para qualquer empresa que tente vislumbrar uma estratégia efetiva de gestão de pessoas (ver quadro “Não é a empresa de seu pai”).
Mapeando as diferenças
Os funcionários da PwC são surpreendentemente jovens: porque recrutamos anualmente cerca de oito mil recém-formados em faculdades e universidades. Dois terços de nosso pessoal têm entre 20 e 30 e poucos anos. Sempre empregamos um grande número de jovens — historicamente, a aposta era de que a maioria dos contratados acabaria mudando para outras empresas ou outras carreiras, enquanto poucos escalariam todos os degraus até chegar a sócio. Mas nesse modelo havia outra hipótese importante: nossos funcionários consideravam a ideia de tornar-se sócio como uma recompensa e justificativa por anos de longas horas dedicadas ao trabalho com clientes. Mas nosso estudo revelou que a perspectiva de um dia tornar-se sócio não é mais suficiente para despertar altos níveis de comprometimento.
Como expressou um millennial de nosso estudo: “As pessoas da minha geração querem uma carreira de crescimento rápido. Queremos tudo agora”. Outro observou: “As gerações mais velhas pensam que as pessoas passam a vida toda na empresa, mas as gerações mais jovens não pensam assim. Se você realmente não tem interesse no trabalho, pode abandoná-lo em dois ou três anos. Isso realmente não é importante. Você pode mudar de local de trabalho, porque o mais importante é gostar do que faz”.
Os millennials estão menos propensos que os filhos do pós-guerra — os boomers — a dar prioridade exclusiva à sua vida profissional, mesmo quando há uma perspectiva de compensação futura significativa. Eles querem flexibilidade no emprego aqui e agora, e querem também oportunidade de treinamento e mobilidade, feedbacks melhores e mais frequentes e recompensas. Outra resposta comum que encontramos na pesquisa: “As pessoas de minha geração (esperam) que sua empresa lhes dê tempo para sua vida pessoal”. Esta constatação estava presente em países desenvolvidos. Embora os jovens do milênio que trabalham na PwC pelo mundo todo aspirem conseguir um grande equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal, a pesquisa mostrou que essa questão tem uma conotação mais acentuada de rotatividade, comprometimento e satisfação profissional na América do Norte, Europa e Ásia que em outras partes do mundo.
Líderes da PwC notaram que precisávamos responder a essa pesquisa de forma radical. Então reorientamos nossa abordagem de capital humano tradicional, desenvolvendo um sistema de condutas de RH baseadas em evidências que atendessem às necessidades de mudanças de nossos funcionários. Ênfase maior em modelos não tradicionais de carreira, às vezes afastam um pouco os clientes, mas sabemos quais são os benefícios de mantermo-nos fiéis ao comprometimento de nosso pessoal. Nas últimas décadas a rotatividade diminuiu cerca de três pontos percentuais — enquanto o engajamento dos funcionários aumentou três pontos percentuais.
Atendendo às expectativas dos millennials
Com base nos resultados de nosso estudo sobre comprometimento adotamos algumas medidas:
Maior input. Nossa pesquisa mostrou que millennials querem que todas as ações empreendidas pela empresa representem seus valores, e estão mais dispostos que os outros a oferecer input sobre questões importantes. Para corresponder a esses anseios, implementamos programas para engajar todo nosso pessoal, de modo que soubessem o que a empresa estava fazendo e por quê. E assim eles poderiam se manifestar sobre seus planos e metas. Pedimos a eles, por exemplo, que sugerissem como investir em capital humano e qual deveria ser a próxima ideia de US$ 100 milhões da empresa. Algumas sugestões foram bastante estimulantes, mas o mais interessante ainda para nós foi saber que 70% da organização participou do processo de idealização. Aumentamos a transparência de nossos programas de recompensa e nos tornamos mais explícitos sobre o que nosso pessoal pode levar adiante à medida que a carreira progride.
Curso da carreira. Millennials querem e esperam a liberdade de mudar o rumo da carreira. Não queremos que precisem nos deixar por causa da mudança. Então instituímos uma política para derrubar barreiras artificiais dentro da organização. Depois que um de nossos funcionários participou do conselho por alguns anos, as oportunidades para tentar coisas novas aumentaram sensivelmente.
Temos um programa chamado Círculo Completo para pessoas que precisam parar de trabalhar por um determinado período por motivos pessoais. Ele permite que elas continuem conectadas à empresa e são reengajadas quando estão em condições de reassumir o trabalho. O programa Flexibility2 Talent Network permite que as pessoas trabalhem para a empresa durante os meses em que o volume de trabalho é maior (de janeiro a março) e sigam outros interesses durante o resto do ano.
Apreciação. Esses jovens têm uma expectativa maior que as de gerações anteriores de serem apoiadas e apreciadas, e recompensas financeiras nem sempre fecham a conta. Descobrimos que millennials tendem a procurar por alguma coisa em vez de, ou além de dinheiro, recompensas que serão benéficas para melhorar a carreira ou a vida pessoal. Por isso decidimos implementar algumas recompensas não pecuniárias para manter as pessoas na empresa. Depois de permanecer um certo número de anos na empresa, por exemplo, alguns são enviados para a Califórnia, onde passam um período aprendendo competências pessoais e recebem treinamento em liderança. Depois de mais alguns anos na empresa as pessoas podem optar por um mês sabático durante o qual podem desenvolver interesses específicos, viajar, ser voluntário ou permanecer em casa com a família.
Valores corporativos e responsabilidade. Negócios precisam criar um ambiente que permita às pessoas desenvolverem-se e superarem-se tanto no escritório como fora dele. Na PwC detectamos maior retenção e desempenho mais alto quando a pessoas estão comprometidas em programas de responsabilidade corporativa. Aqueles que participam, por exemplo, em mais de uma atividade de responsabilidade corporativa têm um período de permanência médio na empresa de 7,4 anos, enquanto os que não participam permanecem na empresa, em média, 6,3 anos.
Os jovens do milênio são rápidos em reagir negativamente a qualquer percepção que desvincule palavras e ações na empresa. Se eles não acreditam em nós, irão embora. Esse é um desafio para qualquer um em posição de liderança e as mídias sociais aumentaram as apostas. Eu tenho perfeita consciência de que se tivesse que dizer alguma coisa que conflitasse com os valores estabelecidos da PwC, poderia ser viral e minha credibilidade seria atingida.
Ajudando na adaptação de gestores
Outra forma de melhorar a experiência profissional de millennials é mudar a atitude dos gestores em relação a eles. É comum nossos sócios e funcionários que estão conosco há muito tempo acreditarem que trabalhar duro é, ou deveria ser, um sinal de honra. Por isso, se para aliviar a tensão alguém precisa levantar-se, dar uma voltinha, ir buscar um café ou fazer uma aula de ioga durante a tarde, o impulso de um boomer seria de dizer para a pessoa se sentar e continuar a trabalhar.
Frequentemente millennials são estigmatizados por serem autoabsorvidos, rápidos em mudar sua lealdade, preguiçosos e descomprometidos com o trabalho. Ouvimos sempre que esses mitos são infundados e é isso exatamente o que eles são. Na PwC usamos a educação para atacar ideias como essas. Ajudamos os boomers a perceber que, embora millennials possam estar mais conscientes dos efeitos maléficos do estresse, e possam valorizar mais outros interesses e atividades não relacionados ao trabalho que os boomers, eles estão muito mais comprometidos com o sucesso da empresa. Eles apenas não estão preparados para sacrificar a saúde e o bem-estar por ela.
Para reforçar o valor da flexibilidade trabalho/vida, há um ano e meio fizemos questão de enfatizar isso para os executivos. Antes de um executivo começar um novo trabalho, ele deveria responder, por exemplo, como permitir que membros da equipe organizassem seus períodos de trabalho ou como autorizá-los a trabalhar em casa. Nós também queríamos que os executivos adotassem um comportamento flexível, o que não era fácil para alguns e garantimos que seriam recompensados por isso em nosso processo de compensações. No ano passado criamos um concurso para atrair ideias para um plano de flexibilidade durante nosso período de maior atividade. Mais de 1.800 equipes se inscreveram, envolvendo mais da metade dos sócios e dos funcionários da empresa.
Concursos são considerados um mecanismo popular para incrementar o engajamento e provocar novas ideias. Em outro concurso direcionado para a flexibilidade do trabalho, várias pessoas sugeriram envolver clientes em nossa proposta. Isso era uma ótima ideia, porque, muitas vezes, parece que o conceito de flexibilidade trabalho/vida segue na contramão dos interesses dos clientes. Uma companhia que estava passando por um processo de fusão esperava, no mínimo, que as pessoas com quem estavam trabalhando na PwC estivessem disponíveis 24 horas por dia. Mas os acordos podem levar semanas — até meses. Tínhamos enfrentado problemas de esgotamento no passado e isso provocou alguns atritos com clientes.
Por isso é importante deixar claro aos clientes, antecipadamente, que embora possamos compreender o nível de suas expectativas, e que pretendemos reagir rapidamente para defender seus interesses, vamos fornecer uma equipe que estará lá 24/7 — e não apenas uma pessoa. Nós concluímos que alocando mais pessoas nas equipes ninguém se sentiria sobrecarregado com os negócios.
Alguns observadores podem notar certa ironia nisso: numa época em que os mais jovens parecem menos direcionados para trabalhar em equipe e são mais individualistas do que nunca, estamos protegendo as pessoas, confiando numa abordagem de equipes. Mas os millennials entendem perfeitamente o valor de trabalhar em equipe e estão tão comprometidos com suas unidades e empresas como as gerações anteriores. O que mudou foi a definição de comprometimento. Ela não representa mais sacrificar a saúde ou deixar a flexibilidade trabalho/vida fora de cogitação, mas ainda inclui o que realmente importa para os resultados dos negócios: uma devoção às missões do cliente e da empresa.
Fonte: HBR