Quando os CEOs preparam mal sua saída, seus sucessores e as empresas sofrem. De acordo com Russell Reynolds, entre 2003 e 2015, a aposentadoria de um em cada sete CEOs de empresas S&P 500, foi seguida pela saída forçada do novo CEO em seus primeiros três anos de exercício na função, sendo que 85% deles, saiu devido ao baixo desempenho ou por imposição do conselho ou de investidores.
Os custos são altos: George Abdusheleshvily, Sócio-Gerente da Ward Howell International estima que uma sucessão fracassada pode reduzir os ganhos em até 3% para empresas com receita de US$ 1 bilhão e capitalização de mercado podendo chegar a bilhões. Isso confirma as constatações anteriores feitas por Nat Stoddard e Claire Wyckoff, cuja pesquisa atribui um custo direto à saída mal planejada de um CEO, “entre US$ 12 e US$ 50 milhões, dependendo do tamanho da empresa e, “perdas no total US$ $ 14 bilhões por ano para a economia americana”.
Não é difícil encontrar explicações para isso. Líderes têm dificuldade em trabalhar o “desapego”, o que faz com que pessoas inteligentes e pragmáticas comportem-se de maneira irracional. Os CEOs podem evitar completamente os assuntos relacionados à sucessão, protelando a questão pelo maior tempo possível, sabotando os esforços do conselho neste planejamento, ou simplesmente, retirando-se do processo. Por conta disto, a sucessão é postergada, o próximo CEO chega despreparado, ou o líder anterior permanece na empresa na capacidade de presidente ou consultor sênior e, continua a dar as ordens. O desempenho da empresa deteriora e, ao mesmo tempo, o novo CEO é profundamente criticado, sai voluntariamente, ou é demitido.
Não precisa ser desta forma. Há muitas empresas no mundo que dominam a arte da sucessão, e milhares de ex-CEOs que deixaram as empresas com muito sucesso. As quatro regras seguintes, resultado de 25 anos de consultoria para conselhos diretores e CEOs, sobre sucessão da liderança e, uma pesquisa de seis anos em 15 países, ajudará tanto os que aspiram ao cargo de CEO como os que já o são, a fazerem o mesmo.
Comece cedo
CEOs inteligentes consideram seus contratos de trabalho como um projeto. Greg (não é seu nome verdadeiro, assim como a maior parte dos exemplos deste artigo), ex-CEO de uma holding de investimentos e agora, sócio de uma empresa de Private Equity, explica: “Talvez a culpa seja da minha experiência anterior na McKinsey, onde pulávamos de projeto em projeto, mas quando me ofereceram o emprego de CEO, eu o considerei apenas como mais um projeto: com finalidades, objetivos e prazo. Eu estabeleci o prazo de cinco a sete anos e combinei com o conselho que, independentemente do que acontecesse, eu sairia depois de sete anos.”
Neste mesmo espírito, CEOs como Greg começam a preparar sua saída assim que termina seu período de integração, ou no mais tardar, seis meses após assumir o cargo. Com esta perspectiva, empregam 10% de seu tempo identificando e, no caso de candidatos internos, preparando seus potenciais sucessores. Geralmente, começam com uma lista relativamente longa de potenciais candidatos, a qual vão reduzindo à medida que a data de sua saída se aproxima. Eles se dão a oportunidade de conhecer o candidato, passam algum tempo com eles, visitam suas operações, conversam com seus subordinados e, se possível, conversam também com os cônjuges. Irão orientar e avaliar esses candidatos, atribuindo-lhes tarefas de desenvolvimento e teste. Se possível, designarão os candidatos mais prováveis como líderes de empresas independentes, que servirá como um “teste simulado” para a função.
Helen, que cumpriu dois mandatos de três anos cada como CEO de uma holding de empresas de transportes, é um exemplo disso. Ela começou a trabalhar sua sucessão assim que assumiu seu segundo mandato. Dois anos antes de sua saída, criou dois cargos de diretor-gerente para dois candidatos. Após 18 meses, avaliou seus desempenhos com o conselho, e escolheu um deles. Três meses antes de sua saída, a decisão foi comunicada ao ganhador e ao perdedor. Daí em diante, trabalhou na passagem do cargo e, no dia combinado, saiu. Juntamente com seu sucessor, convenceu o segundo diretor-gerente a continuar na empresa, concedendo-lhe mais responsabilidade e remuneração.
Peça ajuda
Você não deve planejar a sucessão sozinho. Um CEO deve envolver o conselho ao desenhar o perfil para a posição, identificar e avaliar os candidatos, já que o recrutamento e avaliação do CEO é parte das responsabilidades formais da cúpula diretiva. Além disso, o conselho, juntamente com o restante da empresa, terá de conviver com o sucessor, o que não é o caso do CEO que está de saída.
Do ponto de vista do CEO, o conselho é um recurso valioso no planejamento da sucessão – os membros do conselho são líderes altamente competentes, com redes de relacionamento próprias muito interessantes. Com certeza, os conselheiros têm seus limites naquilo que podem fazer. Têm tempo limitado para dedicar à empresa, e podem não ter experiência operacional relevante. O que fizerem funcionar em suas empresas pode não funcionar em outro lugar. Em decorrência destas limitações, o envolvimento do conselho é mais bem gerido se um comitê de sucessão for constituído, composto por subgrupos de conselheiros que possuam qualificações para contribuir com a procura pelo candidato.
Um ponto fundamental é decidir se será um candidato interno ou externo. Em geral, recomendamos dar preferência a candidatos internos, já que integrar um CEO de fora da empresa pode ser custoso, e há grande risco de fracasso. Uma pessoa de fora só é preferível se ela realmente se destacar em relação às pessoas da empresa, ou quando o CEO e o conselho sentirem que o sucessor precisa empreender uma transformação significativa que demande um líder que traga novas perspectivas para a empresa. Nestas situações, os CEOs devem contratar empresas de recrutamento para auxiliá-los.
Vamos considerar o caso de Oleg, CEO de uma empresa siderúrgica global. Ele iniciou a conversa sobre sua sucessão com o conselho três anos antes da data estabelecida para a sua saída. O conselho delegou a função ao comitê de nomeação, que revisou e alterou duas vezes o mandato e o perfil do futuro CEO. O presidente do comitê encontrou-se pessoalmente com todos os potenciais candidatos à sucessão e, durante os dois últimos anos do mandato de Oleg como CEO, o assunto foi pauta permanente na agenda do comitê. Por fim, uma avaliação detalhada dos candidatos remanescentes, conduzida pelo comitê e pelo CEO, levou à uma recomendação conjunta ao conselho.
Tenha um plano de aposentadoria
Muitos CEOs cometem o erro crassode considerar seu emprego como sendo “tudo”, e também, com o poder para acabar com as suas carreiras. Alexey, chefe de uma empresa russa de extração, disse: “Sou CEO há 12 anos e não consigo me imaginar fazendo outra coisa”. John, líder de uma empresa de serviços financeiros do Reino Unido, compartilhou este sentimento: “Desde meu primeiro emprego, sonhei em me tornar um CEO. Demorou 25 anos. Alguns empregos que tive foram fascinantes, mas nada se compara a estar na posição de CEO. Gostaria de permanecer assim para sempre”.
Não é uma ambição realista. Embora existam muitos casos de CEOs que permanecem em seus cargos por muitos anos, a tendência global no mundo em que vivemos, de rápidas mudanças, é clara: os mandatos tornam-se cada vez mais curtos em todos os mercados – da América do Norte à China. Um mandato de mais de dez anos para o mais alto cargo em uma empresa de capital aberto torna-se um caso especial. Nossa pesquisa com empresas russas indica também que CEOs que ocupam o cargo por mais de 15 anos têm duas vezes mais chances de não conseguir conduzir sua sucessão com sucesso, do que aqueles que deixam o cargo após menos de uma década nesta posição. Tudo isto é condizente com a pesquisa conduzida pela PwC com as 2.500 maiores empresas do mundo, que mostra que aproximadamente 35% dos sucessores de CEOs que tiveram um longo mandato foram forçados a deixar a posição.
Tudo isso sugere que grande parte dos CEOs ainda terá pela frente muito anos de atividade depois de sua aposentadoria, e é por isso que os mais inteligentes planejam como será seu futuro quando saírem da empresa. Igor, que se tornou CEO de uma empresa internacional de mineração e metais aos 45 anos de idade, é um exemplo didático deste caso. Candidato interno, começou a desenvolver planos de dobrar a rentabilidade, investindo em novas tecnologias e na melhoria da eficiência operacional de ativos existentes quatro anos antes de assumir o cargo.
Na época de sua indicação, Igor concordou em ficar no cargo por exatos quatro anos. Ele já tinha algumas ideias sobre como seria sua vida quando saísse do cargo: participar de uma empresa de investimentos (um dos maiores acionistas da empresa), começar sua própria empresa de Private Equity, promover liderança e desenvolvimento de gestão pelo mundo, ou se dedicar integralmente à sua família e cuidar de seus dois filhos para ajudar sua esposa em seu trabalho de pesquisa. Nos três primeiros anos, embora muito ocupado com seu programa de modernização, Igor encontrou tempo para pensar em cada uma de suas opções e discuti-las com as pessoas apropriadas. No quarto e último ano no cargo, fez com que o próximo passo em sua carreira fizesse parte de sua rotina de trabalho, apropriando 15% de seu tempo para isso.
Durante aqueles 12 meses, Igor participou de dez reuniões com potenciais empregadores, mais de 20 reuniões com potenciais sócios em empresa de Private Equity, visitou diversas faculdades de administração e universidades, contribuiu em uma iniciativa de desenvolvimento de liderança, conversou regularmente com sua esposa sobre seu futuro, e fez duas sessões de coaching de carreira. Após ter saído do cargo de CEO, fechou um contrato de cinco anos com uma firma de investimentos (sem horário fixo no escritório), mudou com sua família para um país com melhores oportunidades em educação para seus filhos, e deixou em suspenso, pelos próximos cinco anos, seus planos para a empresa de Private Equity e a iniciativa de desenvolvimento de liderança.
Faça uma ruptura definitiva
Muitos CEOs consideram suas empresas como “filhos”. A ideia de entregá-las aos cuidados de outra pessoa que, eventualmente, comece a mudar as coisas de acordo com seu gosto, faz com que os então responsáveis fiquem ansiosos e superprotetores. Denis, CEO de uma cadeia de lojas de varejo, disse: “Em dez anos, trouxe esta empresa para a liderança de mercado, com uma cultura produtiva e inclusiva. Não tenho certeza se minha potencial sucessora irá mantê-la desta forma. Só conseguirei entregar o cargo caso eu tenha um mecanismo de controle efetivo sobre suas ações como, por exemplo, seu eu for o presidente do conselho ou do comitê de estratégias”.
Denis não estará fazendo um favor à sua empresa se a experiência de Bill, um ex-CEO, servir como exemplo.Convencido de que seu sucessor poderia aproveitar sua enorme experiência e seus insights, Bill negociou um contrato de consultoria com o conselho, pelo período de 24 meses, para ajudar seu sucessor. Em seu novo papel, tinha direito a um escritório na sede da empresa e livre acesso a todas as informações e funcionários. O primeiro embate sério com o novo CEO aconteceu apenas dois meses depois, por ocasião da nomeação do Chief Digital Officer, mas ao final, o CEO em exercício cedeu ao ponto de vista de seu antecessor. O próximo confronto, uma estratégia de Fusões e Aquisições, durou três meses e foi preciso a intervenção direta do presidente do conselho.
Depois disso, o novo CEO enviou uma carta ao conselho, solicitando que proibissem Bill de dar ordens aos executivos da empresa. Bill ficou furioso. Após o primeiro ano, os resultados financeiros haviam deteriorado e a moral do time de gestão havia despencado. Alguns executivos seniores reclamavam de seu novo chefe para o Bill; outros o evitavam a qualquer custo. Quando, 18 meses após ter assumido, o novo CEO pediu demissão, mencionando falta de autonomia como o principal motivo, o conselho imediatamente cancelou o contrato de consultoria com Bill.
Em retrospectiva, Bill se ressente da decisão de ficar, e diz: “não apenas significou um enorme baque para a empresa, como também manchou minha reputação e meu legado”. Agora, recomenda fazer a ruptura total: “Saia da empresa no dia em que deixar o cargo, e não se preocupe: seu sucessor irá procurá-lo caso precise de seus conselhos”.
A escolha e a preparação de um sucessor é a manifestação mais visível e talvez, a mais importante do legado de um líder, e uma sucessão mal sucedida pode perseguir um ex-CEO por muitos anos. Muitos ex-CEOs a quem aconselho, ainda hoje, várias décadas depois, não conseguiram chegar a um acordo consigo mesmos sobre o fracasso de suas saídas. Para a empresa, as consequências de uma sucessão mal planejada serão medidas em moeda forte, e estas sucessões mal conduzidas podem, e acabarão levando, uma boa empresa para as mãos de bons administradores. Este é o motivo pelo qual Cees van Lede, ex-CEO da AkzoNobel e presidente do conselho administrativo da Heineken, diz que só consegue avaliar o desempenho de um CEO após aproximadamente dez anos de sua saída da empresa. Este é o tempo que leva para que o desempenho da empresa reflita a qualidade da estratégia de sucessão de seu CEO.
Stanislav Shekshnia é professor na INSEAD. Ele é, também, sócio sênior na Ward Howell, uma empresa global de consultoria em capital humano, e conselheiro de diversas empresas públicas e privadas na Europa Central e na Europa Oriental.
Fonte HBR