Porém, em questão de meses, a Marinha estava transbordando originalidade — e não por algo que eu tivesse feito. Uma força-tarefa significativa de inovação havia sido lançada — uma base militar do Departamento de Defesa no Vale do Silício —, pronta para atualizar-se em relação à tecnologia mais avançada. Para surpresa geral, essas mudanças não partiram do alto comando da Marinha. Foram iniciadas por um grupo de oficiais juniores, de 20 a 30 anos de idade.
Quando comecei a investigar mais a fundo, vários membros da instituição apontaram para um jovem aviador chamado Ben Kohlmann. Oficiais diziam tratar-se de um perturbador da ordem, agitador, subversivo, herege e radical. E em violação direta ao ethos militar, esses eram apelidos carinhosos.
Kohlmann acendeu o pavio ao criar a primeira célula de inovação rápida da Marinha — uma rede de pensadores originais que colaborariam no questionamento de premissas enraizadas e na geração de novas ideias. Ao começar a montar o grupo, ele buscou as ovelhas negras: pessoas com um histórico de não conformismo. Um dos recrutados fora dispensado de um submarino nuclear por desobediência a uma ordem do comandante. Outro se recusara terminantemente a se submeter ao treinamento básico. Outros protestaram direto aos chefes de operações navais e ignoraram cadeias de comando ao expressarem publicamente em blogs suas opiniões iconoclastas. “Eram lobos solitários”, diz Kohlmann. “A maioria tinha histórico de insubordinação.”
Kohlmann se deu conta, no entanto, de que para alimentar e manter a inovação em toda a Marinha precisaria de mais do que alguns lobos solitários. Então, ao trabalhar como instrutor e diretor de operações de voo, começou a construir uma cultura de não conformismo. Falou com os líderes seniores sobre expandir sua rede e conseguiu o aval. Recrutou marinheiros que nunca demonstraram desejo de questionar o status quo e lhes apresentou novas maneiras de pensar. Incentivou-os a visitar centros de excelência em inovação fora das Forças Armadas, da Google ao Rocky Mountain Institute; devorar um programa mensal de leituras sobre inovação; e debater ideias durante happy hours regulares e discussões online vigorosas. Eles se tornaram pioneiros no uso de impressoras 3-D em navios e de um peixerobô para missões submarinas secretas — e outras células de inovação rápida começaram a brotar em todas as Forças Armadas. “A cultura reina”, diz
Kohlmann. “Quando as pessoas descobrem a própria voz, é impossível fazê-las parar.”
Capacitar as tropas para inovar é onde a maioria dos líderes acaba deixando a desejar. Em vez disso, tentam contratar empreendedores presunçosos para que tragam ideias e energias originais para a organização — e param por aí. É uma filosofia falaciosa, pois pressupõe que os melhores inovadores são criaturas raras com dons especiais. Pesquisas mostram que os empreendedores que têm sucesso a longo prazo são, na verdade, mais avessos ao risco do que seus colegas. A centelha dos craques reluz por algum tempo, mas logo a fagulha se apaga. Desse modo, contar com alguns poucos sujeitos excepcionais que se encaixam em um perfil criativo romantizado é um movimento de curto prazo que subestima os demais. A maior parte das pessoas é, na verdade, capaz de pensamentos e soluções inovadores — desde que sua empresa pare de inculcá-las com conformismo.
Quando todos pensam de modo semelhante e se atêm às normas dominantes, os negócios estão fadados a estagnar. Para lutar contra essa inércia e impulsionar a inovação e a mudança de modo efetivo, os líderes precisam de pensamento original contínuo na empresa. Isso se obtém quando se constrói uma cultura de não conformismo, como Kohlmann fez na Marinha. Tenho estudado o tema por quase uma década, o que se mostrou mais fácil do que eu esperava.
Para começar, os líderes devem dar aos funcionários oportunidades e incentivos para gerar — e continuar gerando — novas ideias, de modo que as pessoas em todas as funções e papéis melhorem a habilidade de ir além do óbvio. Todavia, também é crucial ter as pessoas certas examinando essas ideias. Essa parte do processo deve ser bem menos democrática e mais meritocrática, pois alguns votos simplesmente são mais significativos que outros. E finalmente, para continuar gerando e selecionando ideias inteligentes ao longo do tempo as organizações precisam chegar a um equilíbrio entre coesão cultural e discordância criativa.
Deixando mil flores desabrochar
As pessoas costumam acreditar que para fazer um trabalho melhor devem fazer menos coisas. As evidências desmentem essa premissa: ser prolífico na verdade intensifica a originalidade, pois o volume absoluto aumenta as probabilidades de encontrar novas soluções. Em experimentos recentes realizados pelos psicólogos Brian Lucas e Loran Nordgren, da Northwestern University, as ideias iniciais geradas pelas pessoas eram as mais convencionais. Uma vez que haviam pensado nelas, estavam livres para começar a conceber possibilidades menos usuais. Suas primeiras 20 ideias eram significativamente menos originais do que suas próximas 15.
Em todas as áreas, volume engendra qualidade. Isso vale para criadores e pensadores de todo tipo — compositores, pintores, cientistas e inventores. Até mesmo os inovadores mais eminentes realizam seu trabalho mais original quando estão desovando um número grande de ideias menos brilhantes. Consideremos Thomas Edison. Em um período de cinco anos ele inventou a lâmpada, o fonógrafo e o transmissor de carbono usado em telefones — enquanto registrava mais de cem patentes para invenções que fizeram sucesso, como a boneca falante que acabava assustando crianças (e adultos).
É claro que, nas organizações, o desafio reside em saber quando o número de possibilidades reunidas é suficiente. Quantas ideias você deve gerar antes de decidir quais delas adotar? Quando faço essa pergunta a executivos, a maioria diz que cerca de 20 ideias já são suficientes para refletir um estado de atividade intensa. Mas a resposta não está correta por ordem de magnitude. Há provas de que a qualidade não costuma chegar ao máximo até que mais de 200 ideias sejam apresentadas.
O professor de Stanford Robert Sutton observa que o filme Cars, da Pixar, foi escolhido dentre umas 500 propostas, e na Skyline, o estúdio de design de brinquedos que gera ideias para a Fisher-Price e para a Mattel, os funcionários sugeriram 4 mil novos conceitos de brinquedos em um ano. Esse número foi peneirado para 230 para a produção de desenho e protótipo, e apenas 12 foram finalmente desenvolvidos. Quanto mais dardos se atiram, maiores as chances de acertar o alvo.
Embora faça todo o sentido, muitos gestores acabam por não adotar esse princípio, temendo que o tempo despendido concebendo muitas ideias impeça os funcionários de se concentrar e ser eficientes. A boa notícia é que há maneiras de ajudá-los a gerar quantidade e variedade sem sacrificar a produtividade no dia a dia e sem causar desgaste.
Pense como o inimigo. Pesquisas sugerem que as organizações costumam se prender a uma rotina, pois jogam na defensiva tentando afastar a concorrência. Para encorajar as pessoas a pensar de modo diferente e gerar mais ideias, coloque-as na ofensiva.
É isso que Lisa Bodell, da Futurethink, fez quando Ken Frazier, o CEO da Merck, a contratou para ajudar a subverter o status quo. Bodell dividiu os executivos da Merck em grupos e pediu que apresentassem sugestões de como tirar a empresa do mercado. Em vez de serem cautelosos e se apegarem estreitamente a competências estabelecidas, os executivos começaram a considerar orientações novas e ousadas em estratégia e desenvolvimento de produto que os concorrentes potencialmente adotariam. A energia demonstrada aumentava visivelmente na sala à medida que exploravam as possibilidades. A mentalidade ofensiva, observa a professora Anita Woolley, da Carnegie Mellon, volta sua atenção para “buscar oportunidades, enquanto a defensiva se concentra em manter as participações de mercado”. Essa mudança na mentalidade permitiu aos executivos da Merck imaginar ameaças da concorrência que ainda não existiam. O resultado foi um conjunto original de oportunidades para inovação.
Solicite ideias de indivíduos, não de grupos. Décadas de pesquisas demonstram que mais e melhores ideias são concebidas quando as pessoas trabalham sozinhas em salas separadas do que em brainstorming em um grupo. Quando elas geram ideias juntas, as melhores acabam não sendo nunca compartilhadas. Alguns membros dominam a conversa, outros se retraem para evitar parecer tolos, e todo o grupo tende a se conformar ao gosto da maioria.
Evidências mostram que esses problemas podem ser resolvidos por meio do “brainwriting”. Basta pedir aos indivíduos que imaginem ideias por conta própria antes de o grupo avaliá-las, a fim de que todas sejam apresentadas. Por exemplo, na varejista de óculos Warby Parker, apontada como a empresa mais inovadora do mundo pela Fast Company em 2015, os funcionários despendem alguns minutos por semana anotando ideias de inovação para que colegas leiam e façam seus comentários. A empresa mantém um Google doc que permite aos funcionários inserir solicitações de novas tecnologias a serem desenvolvidas, o que rende cerca de 400 novas ideias em um trimestre típico. Uma grande inovação foi um ponto de venda de varejo remodelado, que se originou de um app que possibilitava aos clientes adicionar suas armações de óculos preferidas aos favoritos e receber mais tarde um email a propósito.
Como os funcionários não costumam revelar suas sugestões mais inusitadas em contextos de grupo, uma boa estratégia para colher ideias é agendar reuniões individuais. Quando Anita Krohn
Traaseth se tornou diretora executiva da Hewlett-Packard Norway, lançou a iniciativa “encontro rápido com o chefe”. Ela convidava cada funcionário a se encontrar com ela por cinco minutos e responder às seguintes perguntas: Quem é você e o que faz na HP? Onde acha que poderíamos mudar e onde deveríamos manter nosso foco? De que outras formas gostaria de contribuir, além de cumprir suas responsabilidades? Ela deixava bem claro que sua expectativa era de que trouxessem grandes ideias, e os funcionários não desejavam desperdiçar seus cinco minutos com um líder sênior — era sua chance de mostrar que poderiam inovar. Após mais de 170 encontros rápidos, tantas ideias foram geradas que outros líderes da HP implementaram o processo na Áustria e na Suíça.
Traga de volta a caixa de sugestões. É uma prática que remonta ao início dos anos 1700, quando um xógum japonês colocou uma caixa na entrada de seu castelo. Ele recompensava as boas ideias — mas punia críticas com a decapitação. Hoje as caixas de sugestões costumam ser ridicularizadas. “Estou detectando uma ideia criativa sendo formada em algum lugar no prédio”: é o pensamento do chefe em um quadrinho de Dilbert. “Preciso encontrá-la e esmagá-la.” Ele coloca então uma caixa de sugestões, e Dilbert se vê intrigado até que um colega o avisa: “É uma armadilha!”.
Porém as evidências apontam para uma conclusão diferente. Caixas de sugestões podem ser muito úteis, justamente por proporcionarem um grande número de ideias. Em um estudo, o psicólogo Michael Frese e seus colegas visitaram uma empresa de aço holandesa (agora parte da Tata Steel) que vinha utilizando um programa de sugestões por 70 anos. A empresa tinha 11 mil funcionários e coletava 7 mil a 12 mil sugestões por ano. Um funcionário típico daria sete sugestões anuais e veria três ou quatro sendo adotadas. Um inovador prolífico apresentou 75 ideias e 30 delas foram aproveitadas. Em muitas empresas, essas ideias teriam sido perdidas totalmente. Para a produtora de aço holandesa, entretanto, a caixa de sugestões regularmente propiciava melhorias — com economia de mais de US$ 750 mil somente em um ano.
O maior benefício das caixas de sugestões é que multiplicam e diversificam as ideias no horizonte, abrindo novas avenidas para inovação. O principal obstáculo é que essas caixas são um enorme palheiro, ou seja, é praticamente impossível achar a agulha. É preciso um sistema para selecionar as contribuições — e recompensar e adotar as melhores — de modo que as pessoas não sintam que suas sugestões estão entrando por um ouvido e saindo pelo outro.
Desenvolvendo um faro para as boas ideias
Gerar muitas alternativas é importante, e o mesmo vale para ouvir as opiniões e soluções corretas. Como os líderes podem evitar adotar as ideias ruins e rejeitar as boas?
Conte com pessoas que já deram provas de bons avaliadores. Embora muitos líderes utilizem um processo democrático para selecionar ideias, nem todo voto tem o mesmo valor. Di-
zer amém ao desejo da maioria não é a melhor política — uma minoria seleta pode ter um senso mais aguçado de quais ideias têm maior potencial. Para descobrir quais votos devem ser levados em conta, preste atenção ao histórico de avaliação dos funcionários.
No fundo de hedge Bridgewater, as opiniões dos funcionários são avaliadas por uma nota de credibilidade, que reflete a qualidade de suas decisões passadas naquela área. Na comunidade da inteligência americana, os analistas demonstram sua credibilidade por prever eventos econômicos e políticos de grande vulto. Em estudos realizados pelo psicólogo Philip Tetlock, os profissionais de previsão são avaliados pela precisão (seus prognósticos estavam corretos?) e calibração (acertaram nas probabilidades?). Uma vez identificados esses, pode-se atribuir às suas opiniões um peso maior do que as de seus colegas.
Assim, em uma empresa quem estaria mais propenso a ter o histórico mais relevante de avaliação? Não são os gestores — é muito fácil se apegarem a protótipos já existentes. E tampouco os próprios inovadores. Inebriados por seus momentos de eureca, tendem a se fiar por demais em suas chances de sucesso. Podem tentar compensar esse aspecto ao pesquisar as preferências dos clientes, mas ainda estariam suscetíveis ao viés da confirmação (buscando informações que deem respaldo ao seu ponto de vista e rejeitando os demais). Mesmo os gênios criativos têm problemas em prever com qualquer grau de precisão se já apresentaram uma ideia vencedora.
As pesquisas sugerem que os colegas inovadores são os melhores avaliadores de ideias originais. São imparciais, pois não estão julgando suas próprias ideias, e estão mais dispostos a dar uma oportunidade às possibilidades radicais do que os gestores. Por exemplo, o professor Justin Berg, de Stanford, constatou que os atores circenses que avaliavam as novas apresentações de seus colegas acertavam duas vezes mais do que os gerentes na previsão de popularidade com o público.
Faça disso um concurso. Competições de ideias podem ajudar os líderes a separar o joio do trigo, seja garimpando as sugestões depositadas na caixa ou promovendo um evento ao vivo de inovação. Na Dow Chemical, por exemplo, os funcionários participam de uma competição anual de inovação cujo tema é redução do lixo e economia de energia. O concurso solicita ideias que exijam um investimento inicial inferior a US$ 200 mil cujos custos possam ser recuperados no prazo de um ano. Os colegas examinam as ideias apresentadas, e há recompensas monetárias para os vencedores. Os pesquisadores de inovação Christian Terwiesch e Karl Ulrich relatam que por mais de uma década os 575 projetos resultantes produziram um retorno médio de
204% e representaram uma economia à empresa de US$ 110 milhões anuais.
Quando uma competição de inovação é bem projetada, reúne-se um conjunto vasto de ideias iniciais, agrupadas em torno de temas-chave em vez de uma gama de tópicos. As pessoas despendem bastante tempo preparando suas propostas, o que pode incrementar a qualidade, mas o trabalho em si se desenrola em um espaço de tempo discreto, de modo que a competição não constitui uma distração recorrente.
Uma avaliação completa ajuda a descartar as ideias ruins. O processo de feedback envolve a avaliação das propostas por um grupo de especialistas na matéria e colegas inovadores, classificando o grau de novidade e utilidade e fornecendo sugestões para melhoras.
Contando com os juízes certos, um concurso de inovação não só tira o melhor proveito do conhecimento de todos, mas também os torna mais sábios. Os colaboradores e avaliadores acabam por aprender a partir dos sucessos e falhas dos outros. Com o tempo, é possível desenvolver uma cultura em que os funcionários se sintam confiantes em sua habilidade para colaborar com ideias — e desenvolvam um gosto mais apurado sobre aquilo que constitui qualidade. Como os inovadores bem-sucedidos ganham reconhecimento e recompensas, todos têm um incentivo para participar.
Desse modo, comece por solicitar ideias para solucionar um problema ou aproveitar uma oportunidade, e então introduza um processo rigoroso de avaliação e feedback. As propostas mais promissoras chegarão ao próximo turno, e os vencedores finais devem angariar a equipe e recursos necessários para implementar suas ideias.
Cultivando tanto a coesão como a discordância
A construção de uma cultura de não conformismo começa por aprender a gerar e a examinar ideias, mas não acaba por aí. Para que se mantenha a originalidade ao longo do tempo, é preciso que os líderes continuem lutando contra as pressões que a suprimem.
Costumávamos culpar o conformismo presente nas culturas fortes, acreditando que eram tão fechadas e íntimas que os membros não eram capazes de considerar pontos de vista diversos e tomar decisões sábias. Mas isso não é verdade. Estudos de tomada de decisão em equipes da alta gestão mostram que grupos coesos não são mais propensos do que os outros a buscar consenso, descartar opiniões divergentes e serem vítimas do pensamento de grupo. Na verdade os membros de culturas fortes costumam tomar melhores decisões, pois se comunicam bem uns com os outros e estão seguros o suficiente em seu papel individual e à vontade para questionar uns aos outros.
Aqui temos a prova de como os fundadores bem-sucedidos no Vale do Silício desenvolveram suas startups: suas contratações se baseavam essencialmente no comprometimento com a missão, buscando pessoas que ajudassem a realizar a visão da empresa e a viver de acordo com seus valores. Os fundadores que buscavam principalmente habilidade técnica ou craques potenciais não se deram tão bem. Nos setores maduros, também, a pesquisa mostra que quando as empresas colocam uma forte ênfase na cultura, seu desempenho permanece mais estável.
Mesmo assim há um lado obscuro em relação a culturas fortes e coesas. Podem se tornar homogêneas se não forem controladas. À medida que os líderes continuam a atrair, escolher e manter pessoas semelhantes, acabam por sacrificar valores e diversidade de pensamento. Os funcionários se deparam com uma pressão intensa para se encaixar ou então sair. Essa uniformidade pode ser vantajosa em ambientes previsíveis, mas há um problema em setores voláteis e em mercados dinâmicos. Nesses contextos, culturas fortes podem ser fechadas demais para responder de modo apropriado a condições flutuantes. Os líderes têm dificuldade em reconhecer a necessidade de mudança, considerar pontos de vista diferentes, aprender e adaptar-se.
Tomemos o caso da BlackBerry: após terem causado disrupção no mercado do smartphone, os líderes seniores se apegaram à convicção de que os usuários estavam primeiramente interessados em email eficiente e seguro. Descartaram o iPhone como reprodutor de música e brinquedo do consumidor, contrataram membros com a mesma mentalidade que conheciam engenharia, mas não eram especialistas em marketing, e acabaram por não criar um web-browser de alta qualidade e um sistema de operação de fácil uso com aplicativos. O resultado? Um enxugamento enorme, uma perda de de bilhões de dólares e um colapso colossal da participação de mercado.
Assim, para manter a cultura forte numa equação equilibrada é preciso um fornecimento contínuo de opiniões críticas. Mesmo quando estão erradas, são úteis — quebram o consenso automático, estimulam o pensamento original e ajudam as organizações a encontrar soluções novas para os problemas. Na célula para inovação rápida da Marinha, a norma é “oposição leal”, diz Joshua Marcuse, um dos colaboradores de Ben Kohlmann no Pentágono. “Agitar contra o status quo é a forma de contribuirmos para a missão.”
Em suma, faça da discordância um dos valores centrais de sua organização. Crie um ambiente em que as pessoas possam compartilhar opiniões críticas abertamente e sejam respeitadas por fazê-lo. Nos primórdios da Apple, os funcionários estavam comprometidos intensamente em fazer do Mac um produto doméstico de fácil uso. Além disso, todo ano a equipe do Mac distribuía um prêmio a quem houvesse desafiado Steve Jobs. Cada um desses ganhadores de prêmio foi promovido.
Coesão e discordância soam contraditórias, porém uma combinação das duas é o que traz novas ideias à mesa — e impede uma cultura forte de se tornar um culto. Aqui temos algumas maneiras de manter esses princípios em uma tensão produtiva:
Priorize valores organizacionais. Dê às pessoas um delineamento que as ajude a discriminar opiniões conflitantes e permita que as melhores ideias se destaquem. Quando as empresas deixam de priorizar valores, o desempenho é prejudicado. Meu colega Andrew Carton conduziu um estudo demonstrando que em todos os hospitais os índices de readmissão de pacientes que haviam sofrido ataques cardíacos eram menores e os retornos sobre o ativo eram mais altos quando os líderes articulavam uma visão convincente — mas somente se não apontavam mais do que quatro valores organizacionais. Quanto mais valores enfatizavam além desse número, maiores as chances de as pessoas os interpretarem diferentemente ou de não se concentrarem nos mesmos valores.
Os valores precisam ser classificados em determinada ordem de modo que quando os funcionários se depararem com escolhas entre cursos de ação concorrentes, saberão qual deles vem primeiro. Na empresa de software Salesforce.com, confiança é definida explicitamente como valor número um, acima de crescimento e inovação. Isso passa uma mensagem bem clara aos funcionários: ao trabalharem para a criação de software novo, nunca comprometam a privacidade dos dados. Na varejista online de calçados e roupas Zappos.com, o CEO Tony Hsieh prioriza a felicidade do funcionário acima da felicidade do cliente. Na empresa aérea WestJet a segurança é o valor mais importante. E na GiveForward, empresa que ajuda as pessoas a levantar verbas para causas, a compaixão consta no topo da lista. Embora a cobertura da mídia seja crucial para o sucesso da empresa, o cofundador Ethan Austin observa: “Não divulgaremos uma história na mídia a menos que tenhamos certeza de que o cliente cuja história estamos compartilhando se beneficiará mais do que nós”.
Uma vez que tiver priorizado os valores, continue a examiná-los de perto. Encoraje os novos funcionários a questionar “o modo da empresa” quando dele discordarem. Esses são aqueles com a perspectiva mais original, que ainda não se tornaram “nativos”. Se já se familiarizaram com a cultura antes mesmo de se pronunciarem, é que já começaram a acompanhar os toques do mesmo tambor. Na Bridgewater, quando novos funcionários são treinados a pergunta que lhes é feita sobre os princípios da empresa é: você discorda?
Solicite problemas, não somente soluções. Ao trabalhar com executivos, o psicólogo organizacional David Hofmann gosta de pedir que preencham as lacunas desta frase: “Não me tragam ___; tragam-me ___”. A resposta unânime é sempre: “Não me tragam problemas, tragam-me soluções!”.
Embora líderes adorem que os funcionários venham com soluções, há uma consequência acidental: as investigações são desencorajadas. Se o que se espera é sempre uma resposta pronta, você chegará às reuniões com seu diagnóstico completo, perdendo a oportunidade de aprender partindo de uma ampla gama de perspectivas. Isso pode ser particularmente comum nos Estados Unidos: em um estudo comparativo recente entre grupos de decisão americanos e alemães, os alemães mencionavam problemas duas vezes mais e soluções 30% menos. “Os americanos são impulsionados a encontrar soluções rápido”, observam os pesquisadores, “ geralmente sem uma análise completa e abrangente do problema.”
Quando os membros de um grupo têm informações diferentes, como costuma ser o caso nas organizações, é mais inteligente reunir todos os problemas antes de buscar as soluções. Na empresa de música digital Spotify, em vez de trabalharem em projetos, as pessoas se organizam em torno de problemas do negócio de longo prazo. “Se fossem fáceis de resolver”, observa o diretor executivo de tecnologia Oskar Stål, “já os teríamos resolvido.” Quando criamos uma nova equipe, as pessoas tipicamente permanecem reunidas em torno de um problema do negócio por pelo menos um ano. Se resultar em sucesso, a equipe e a missão existirão por muito tempo. A cofundadora da Angie’s List Angie Hicks semanalmente ouve as preocupações de seus funcionários. E quando Anita Krohn Traaseth se tornou CEO dos esforços de inovação do governo norueguês, ela novamente utilizou “encontros rápidos” para que os funcionários se pronunciassem. Para se assegurar de que teria visibilidade total dos problemas, pedia às pessoas que nomeassem os três principais pontos de estrangulamento no trabalho e o que gostariam de salvaguardar ou modificar. Apenas após reunir problemas dos 14 escritórios é que começou a implementar as soluções.
Não designe o papel de advogado do diabo a ninguém — encontre-o. Uma pesquisa do psicólogo da UC Berkeley Charlan Nemeth demonstra que atribuir a alguém o papel de advogado do diabo não resolve o problema do viés da confirmação. Embora as pessoas possam considerar o contra-argumento da boca para fora, no final se apegarão aos seus próprios pontos de vista.
A fim de fazer diferença, o advogado do diabo precisa, de fato, de uma visão discordante, e não somente verbalizá-la para fins de argumentação, e o grupo deve acreditar que a discordância é autêntica. Nessas circunstâncias, os grupos examinam mais informações contra o ponto de vista da maioria do que a favor dela e são menos confiantes em suas preferências originais. É raro que uma discordância simulada seja argumentada vigorosamente ou tomada a sério; a discordância real é que estimula o pensamento.
Grupos com discordantes autênticos geram mais — e melhores — soluções para os problemas. É conhecido o fato de Abraham Lincoln solicitar aos seus rivais políticos que fizessem parte de seu gabinete sabendo que genuinamente teriam opiniões contrárias. Em uma assembleia anual recente da Berkshire Hathaway, Warren Buffett convidou um comerciante que estava vendendo as ações a descoberto a compartilhar suas críticas. É claro que a estratégia só funciona se aquilo que o discordante tem a dizer for claramente valorizado e respeitado.
Dê o exemplo de receptividade ao feedback crítico. Muitos gestores acabam por promover conformismo, pois seu ego é frágil. Pesquisas revelam que a insegurança impede os gestores de buscar ideias e os leva a responder defensivamente às sugestões. Os funcionários rapidamente percebem isso e não revelam suas ideias para evitar problemas. Uma forma de superar essa barreira é encorajar as pessoas a questioná-lo abertamente.
Há alguns anos, na empresa de software Index Group, o CEO Tom Gerrity reuniu toda a sua equipe de cerca de 100 pessoas e fez com que um consultor lhe desse feedback negativo na frente de todos. Quando os funcionários viram seu CEO escutar as opiniões críticas, ficaram menos preocupados em se pronunciar. E os gestores se tornaram mais receptivos a comentários difíceis.
E possível também fazer com que as pessoas o questionem quando você divulga seus pontos fracos. “Quando se é o líder, é realmente difícil ter um feedback bom e honesto, por mais que se peça.” A diretora executiva de operações do Facebook Sheryl Sandberg diz: “Um pequeno truque que descobri é que tento falar abertamente sobre as coisas as quais me falta habilidade, pois isso dá às pessoas permissão para concordarem comigo, o que é muito mais fácil do que ser o primeiro a apontar esse aspecto”. Por exemplo, Sandberg conta aos seus colegas que tem o hábito de falar demais nas reuniões. “Se nunca tivesse mencionado isso, será que alguém viria até mim e diria Hey, Sheryl, acho que já falou demais por hoje? Duvido.”
Para que uma cultura da originalidade floresça, os funcionários precisam se sentir livres para contribuir com suas ideias aparentemente impossíveis. Mas costumam temer se pronunciar, mesmo que nunca tenham visto nada de ruim acontecer àqueles que o fazem. Para lutar contra esse medo na Marinha, Ben Kohlmann rejeitou a ênfase tradicional das Forças Armadas na hierarquia.
Todos se comunicavam dirigindo-se uns aos outros pelo primeiro nome, ignorando a posição hierárquica. “Se tiver uma ideia, ponha na mesa para todos e faça o que puder com ela”, dizia aos membros de sua célula de inovação rápida. E os apresentava a pessoas que haviam defendido criatividade e mudança na Marinha, para mostrar que isso era possível.
Outras maneiras de cortar o medo pela raiz incluem elogiar o funcionário por se pronunciar, mesmo quando suas sugestões não são adotadas, e compartilhar as ideias que você mesmo tenha, por mais impulsivas que sejam. Sem que haja algum grau de tolerância na organização para ideias ruins, o espectro do conformismo começará a se mostrar. Em última análise, acolher uma gama maior de percepções do que o habitual é essencial na promoção do pensamento original relevante. Se não for bem-sucedido no começo, saberá que está mirando alto o suficiente.
Adam Grant é professor de gestão e psicologia da Wharton School da University of Pennsylvania e autor de Originals: how non-conformists move the world (Viking, 2016).